domingo, 11 de setembro de 2022

Eu, Autista.

Gente, eu nunca falei disso aqui, mas acho que, além de ter Transtorno Esquizoafetivo, estou no Espectro Autista.

Comecei a me inteirar sobre esse assunto em 2020, após conhecer alguns perfis de autistas no Instagram e me identificar com muitas das coisas que são relatadas neles e, também, num documentário que assisti chamado "Stimados Autistas", que tem no YouTube. Depois disso assisti e li muito mais conteúdo sobre isso até agora e cada vez mais me convenço que sou uma autista ainda não diagnoticada.

A verdade é que se eu estiver certa, seja lá por que motivo for, minha psicóloga não me diagnosticou na infância, mas eu tive algum tipo de suporte, já que comecei a fazer terapia com ela aos 5 ou 6 anos de idade, parei lá pelos 12 e depois voltei a fazer dos 14 aos 17 mais ou menos. Durante meu tratamento na adolescência foi levantada por ela a hipótese de depressão e de TDAH.  Ela recomendou que consultasse um psiquiatra, mas na época isso não foi feito, seja por economia ou ignorância de meus pais, e, mesmo eu tendo iniciado um tratamento com medicamentos, não houve consulta minha ao psiquiatra. Comecei a tomar os mesmo medicamentos que minha mãe, na época, um antidepressivo e outro para TDAH. É óbvio que isso não era o correto a ser feito mas na época eu não tinha muita noção de como era o protocolo para esses casos, portanto apenas usei os remédios. Nessa época eu havia voltado a consultar pois estava sofrendo de transtorno alimentar (eu não estava me alimentando). Acabei melhorando e a terapia com a psicóloga foi interrompida novamente. Também estava tendo sérias dificuldades com meu pai por eu ser LGBT o que contribuiu para interrupção do tratamento, ainda que eu tenha continuado a tomar os medicamentos. 

Portanto acabei tendo suporte para certas dificuldades que acompanham quem está no Espectro Autista, ainda que não tivesse sido diagnosticada. Vale dizer que nessa época a visão do autismo era extremamente estereotipada e havia muito pouca informação acerca do assunto na mídia, entre pessoas leigas e até mesmo no próprio meio médico. 

Hoje estava vendo sobre o "tripé" para o diagnóstico de autismo, que é apresentar essas 3 características desde a infância:
dificuldades de interação social, problemas de comunicação social e comportamentos repetitivos e restritos.

Além desses tem muitas outros comportamentos, fatores e sintomas que fazem parte do Espectro, alguns com os quais me identifico e outros não, já que o Espectro Autista é amplo e hoje se sabe que nem tudo são estereótipos e que cada autista é diferente, não são todos iguais como acham algumas pessoas.

No meu caso, até mais ou menos os 8 ou 9 anos, todos os dias acordava muito cedo, mais ou menos 6 horas da manhã e ia acordar minha mãe. Ela conta que eu abria os olhos dela com os dedos enquanto perguntava: "Mãe, mãe, tu tá acordada?"  Ao que ela respondi meio dormindo: "Agora tô." E eu pedia para ela preparar como ela conta, meu mamá e, como lembro com perfeição, para colocar no vídeocassete um filme para eu assistir até a hora de os desenhos começarem na Globo. 

Normalmente ela ia dormir mais um pouco e eu ficava vendo TV. O filme foi, durante anos, repetidamente o mesmo: De Volta para o Futuro. Ou seja, minhas manhãs pareciam um looping temporal. O filme tinha sido gravado da TV, assim como outros filmes que eu amava assistir, mas esses em outros horários, como E.T. - O Extraterrestre e Em Busca do Vale Encantado.

E esses rituais diários, essas rotinas, extremamente repetitivas, continuaram depois de adulta. Claro que hoje são outros, mas é impressionante, as vezes tenho impressão que meus dias são iguais, de tão repetitivos que são algum comportamentos que tenho. Quase tive diagnóstico de Transtorno Obssessivo Compulsivo, mas é um pouco diferente.  Pois se não me engano as pessoas com TOC quando não conseguem executar seus rituais acham que algo terrível vai acontecer e no meu caso sei que não vai acontecer algo terrível, mas mesmo assim me sinto quase obrigada a fazer daquela forma se quero me sentir mais tranquila e estável. Apesar de algumas vezes me sentir meio engessada. Tem também minha alimentação, que é muito engraçada.  Passo meses me alimentando basicamente dos mesmos alimentos repetidamente.  É como se o mundo estivesse num período de escassez e só houvesse aqueles alimentos no mundo para compor minha lista de supermercado e meu cardápio. Acredito ter um pouco de rigidez cognitiva envolvida nisso, mas tem vezes que consigo quebrar isso.

Mudando de assunto, mas ainda falando sobre sintomas do autismo,  faz anos que me sinto mal quando vou ao supermercado. Assim como ao Shopping ou a lugares com muita aglomeração. Acabei deixando de ir ao supermercado certa época, tamanho o mal estar que sinto. Nessa época tive  diagnóstico de Fobia Social e tomava ansiolítico. Mas eu não sabia nem explicar o que sentia e nem deixar de sentir.  Até que descobri o mundo dos fones de ouvido. Os ruídos e sons altos ou repetitivos sempre me incomodaram muito. O que é diferente de música, que sempre amei tanto ouvir, quanto cantar. Mas todo resto que não se encaixa nessa categoria, se for muito alto ou repetitivo por um tempo longo, me perturba e irrita ao ponto de me deixar quase descontrolada. E na rua e nos locais de aglomeração o som me perturba ao ponto de me deixar zonza, irritada e, muitas vezes,  com dor de cabeça. Por isso para mim, já faz alguns anos, fones de ouvido são uma necessidade. As vezes só para ficar com eles diminuindo o barulho, mesmo que a musica esteja desligada. Não resolve totalmente, mas ajuda. 

Quando adolescente saí à noite algumas vezes para festas em danceteria, pubs ou bares, e nessa época eu lembro que me sentia bem e mal ao mesmo tempo. Já aconteceu de eu dormir sentada em algumas festas e em outras eu ler um livro em algum canto. Para eu conseguir curtir mesmo a festa,  me soltar e ficar tranquila em relação a multidão, barulho, interações sociais, percebi que tinha que estar sob efeito de alguma coisa, tipo álcool ou Maryjane. Isso foi bem antes de 2007, ano em que passei por uma crise e desde quando me tornei abstêmia de qualquer droga de abuso, incluindo álcool. Só o cigarro que larguei um pouco depois, em 2011 se não me engano. 

Mas enfim, até 2020 eu nunca tinha ouvido falar em Transtorno Sensorial. Quando ouvi, percebi que parecia se encaixar com o que eu sentia, apesar de eu entrar em crise poucas vezes.  Mas as vezes acontece de, assim como nas danceterias eu "dormia", eu ir num cinema assistir aqueles filmes que o som é muito pesado, tipo Star Wars, e após um tempo naquele barulhão, praticamente desmaiar na poltrona. O que me lembra da minha infância.
Nas festas e eventos eu tinha crises de irritação onde sapateava e fazia um som horrível esganiçado, enquanto, por ter medo do meu pai,  tentava conter o grito que queria sair da minha garganta ao mesmo tempo que procurava extravasar o acúmulo de sentimentos decorrentes do bullying que sofria por parte das outras crianças e dos excessos de estímulos sensoriais presentes nas festa ou evento. Normalmente os eventos acabavam com eu exaurida, muitas vezes "dormindo" em algumas cadeiras unidas, quando ocorriam em restaurantes, outras vezes dormindo onde pudesse, em algum lugar como sofá ou poltrona,  quando era casa de algum conhecido. Era como se tivessem me tirado a pilha. O ponto é que o transtorno sensorial, além do bullying me geravam crises e exaustão, mental e emocional,  ainda que eu não soubesse perceber claramente ou explicar a parte sensorial para os outros, por ser criança e não entender direito o que se passava comigo. 

Falando novamente sobre interações sociais, quando estava no maternal não tinha amigos. No Jardim A, única vez que estudei em escola particular, a professora pediu para conversar com meus pais. Falou em possibilidade de superdotação, pois meus trabalhos, minha criatividade e principalmente meus desenhos (pelo menos na época) estavam muito avançados para a minha idade. Mas também disse que eu tinha dificuldades de socialização, que eu pouco interagia com as outras crianças, ficando a maior parte do tempo desenhando e que, apesar da possibilidade de superdotação, eu tinha um pouco de dificuldade com atividades dirigidas, preferindo na maior parte das vezes o desenho livre ou outras atividades onde podia fazer as coisas de forma mais livre. Por esses últimos motivos, com ênfase na socialização, ela recomendou a meus pais que eu ficasse no Jardim A mais um ano. Sim, ela queria me rodar no Jardim A, KKKKKKKKK. Mas falando sério, eu me lembro com carinho dessa professora e acredito que ela queria me dar mais tempo para que eu estivesse mais preparada no momento em que o ensino se torna um sistema um pouco mais rígido, como por exemplo a partir da primeira série. Ela também sugeriu fortemente que meus pais procurassem uma escola "especial" para crianças com superdotação. Meus pais me relataram que na época não tinham dinheiro para manter algo assim. E preferiram que eu não fizesse o Jardim A mais uma vez. Também me tiraram da escola onde estudava, após o período letivo terminar, pois estavam sem dinheiro para continuar a pagar colégio particular e nós havíamos nos mudado de bairro antes ainda do fim do ano.

No Jardim B, agora em um colégio público, tentava as vezes interagir com outras crianças,  mas sofria bullying e tinha dificuldades com a comunicação.  Comecei a falar com 2 anos e meio, o que acho que não configura atraso da fala, mas aprendi a falar até bem. Minha dificuldade não era para falar, mas o quê falar, quando falar, sim, eu sei que era criança, mas as vezes era como se eu e as outras crianças falássemos línguas diferentes e eu ainda tinha poucas chances de aprender a linguagem delas por elas me excluírem a maior parte do tempo. Na primeira série me lembro de mim mesma totalmente sozinha, sem um único amigo, passando os recreios sozinha, e foi quando descobri um lugar chamado biblioteca e começou minha paixão por ler.  Escrever já era outra história. Até hoje minha mãe lembra de quando minha professora, que estava a um ano de ser aposentar, chamou ela para dizer que eu não só desde o início do ano me recusava a fazer as anotações da matéria que ela passava no caderno, como, após um dia ela ter me obrigado a copiar, eu havia subido na classe e rasgado o caderno em dois.  E o pior é que, segundo conta minha mãe, eu havia sido aplaudida pelos outros colegas. O fato é que mesmo assim continuei sem amigos e ainda a professora, não só pelas minhas lembranças,  mas pelo que minha mãe diz ter ouvido sobre ela, era uma pessoa rígida, intransigente e muito pouco pedagógica. O que me salvava era que naquela época, mesmo sem copiar, tirava 10 em quase tudo, principalmente nos Ditados. O que dificultava a professora no seu argumento de que eu TINHA que copiar a matéria e não ficar desenhando enquanto ela dava aula. O fato é que não sei se deveria ou não copiar, mas eu conseguia, sim, naquela época, aprender e guardar o conteúdo, apenas ouvindo e lendo o que ela escrevia no quadro enquanto eu desenhava, e o método dela de tentar me intimidar, apesar de me deixar apavorada, com medo dela, não causava o efeito de me fazer copiar a matéria, pois naquela época, mesmo sabendo ler maravilhosamente bem e tendo uma escrita ótima, eu achava insuportável copiar o que os professores escreviam no quadro. E isso durou praticamente todo meu ensino fundamental e ensino médio. 

Na segunda série, nos mudamos de novo, e acabei trocando de colégio novamente. Dessa vez a professora era legal e me sentia acolhido por ela. Ia bem nas avaliações, mesmo sem copiar matéria e ela respeitava minha dificuldade, pois como disse um dia para minha mãe: "Como é que eu vou obrigar ele a copiar se ele tira 10 nas avaliações e faz os exercícios de forma satisfatória."

Também, ainda quando era criança, eu fazia um curso de gratuito em um Centro de Línguas no qual meus pais haviam conseguido vaga para mim, tive problemas com outra professora por conta da minha dificuldade em copiar. Era professora de inglês e não aceitava que eu não copiasse a matéria e ainda assim fosse bem nos exercícios e avaliações. Por isso implicava comigo, me obrigando a repetir a pronúncia das palavras de forma repetitiva, mesmo quando já estava claro que estava correta, ainda mais para uma criança e sem fazer o mesmo com os outros alunos. Também tentava me humilhar na frente da outras crianças quando fazia as tentativas de me obrigar a copiar. Mas o fato é que eu ia bem nas provas, trabalhos e testes e mesmo tendo tirado 10 na avaliação semestral, ela tentou me repetir de semestre. Minha tia teve que ir lá enfrentar a megera, depois de eu ter chegado chorando na casa dos meus avós e explicado tudo.  Após isso ter acontecido consegui ir para o próximo semestre, mas... Adivinhem quem era a professora? A mesma! E foi assim que eu desisti do curso de inglês, mesmo amando essa língua, e fui execrada pelo meu pai, que tentou me obrigar a continuar, sem ter movido um dedo para tentar me colocar com outra professora, pelo simples motivo de que ele não dava a mínima para o meu motivo para querer desistir. E após muita briga, medo, e a intervenção da minha mãe, consegui sair do curso,  mas como fui contra a vontade do meu pai ele deixou claro que "a oportunidade ele tinha dado, se eu desisti o problema era meu e ele nunca mais me daria essa oportunidade de novo." E ele cumpriu o que disse.

E no fim, durante a escola, até a quinta série, eu vivia na biblioteca e não tinha amigos.  Contei em outras postagens sobre a namoradinha que tive aos 9 anos, que na verdade era mais como uma amiga para eu brincar com as Barbies dela. E tinha dificuldades de interação com a maioria dos meus colegas, pois os poucos amigos que fazia, eu não conseguia interagir de forma satisfatória. Era como se eu não entendesse direito o que era esperado de mim nas amizades. E isso dificultava muito a manutenção de qualquer amizade.  Ainda complicava que desde a segunda série eu sentia coisas estranhas e difíceis de explicar por meninos.  Lembro que nessa época tinha um colega, que era muito bonito e popular e que eu sentia algo romântico por ele.  Achava ele lindo e queria ficar perto dele,  mas eu, que já sofria bullying, não tinha a mínima chance. Quando tentei me aproximar dele, fui rechaçada em definitivo, mesmo não tendo, pelo menos acredito que não, transparecido para ele que eu tinha sentimentos românticos por ele.  E na quarta série,  lembro que convidei um menino, colega de aula,  para ir na minha casa.  Eu gostava dele e me declarei e ele, além de pedir emprestado um brinquedo meu e nunca mais devolver, contou para todo mundo no colégio o que tinha acontecido, o que fez o bullying piorar mais ainda e meu isolamento também.  Fui ter uma amiga íntima que pareceu me entender só na quinta série.  E somos amigos ainda. Mesmo com afastamentos ocasionais, somos amigos até hoje. 

E a maioria das outras amizades acabaram sendo sempre curtas e passageiras, pois tenho dificuldades as vezes até para conseguir me comunicar por aplicativos de mensagens.  Mas na maior parte das vezes me acho péssima e acho dificílimo manter uma conversa por escrita e mensagem de voz.  As vezes consigo, mas é raro, e muitas vezes me sinto péssima, as vezes durante a conversa,  outras vezes depois. Na adolescência participei durante cinco anos de oficina de teatro, e apesar de ser péssima nas atividades de improvisar como muitas vezes era necessário, fizemos algumas peças e eu ganhei mais desenvoltura para falar e eu diria que habilidade em fazer Masking, o que me ajudava na interação social, pois consegui aprender a imitar melhor os comportamentos neurotípicos das pessoas ao redor para tentar ser mais incluída em alguns grupos, pelo menos. Mas por mais Masking que se faça, a maior parte das amizades tem prazo de validade, pois acabo me afastando ou a pessoa se afasta, pois tenho dificuldades de agir como as pessoas esperam nas amizades, até por que isso não é algo que eu tenha aprendido naturalmente na infância. Eu sempre fui solitária. Minhas amigas eram minha mãe e a psicóloga. E de amigo eu tinha meu irmão mais novo. 

No fim acaba que sou uma pessoa que tem o circulo social muito restrito e que passa a maior parte do tempo sozinha em casa.  E não tenho relacionamentos afetivos com ninguém desde de 2013, quando faleceu de câncer meu último namorado. E até hoje só tive três namoros mais longos.  Um com um homem de cerca de 27 anos,  quando eu tinha 15, o que hoje eu sei ser algo bem problemático, apesar de eu ter amado muito ele. Outro que iniciou nos meus 20 anos, que durou se não me engano até 2009, mas foi um relacionamento definitivamente abusivo, com direito a ele apontar uma arma na minha cara por eu ter contado certas coisas para ele. E, por último, o meu falecido "amigo" de quem falei muito nesse blog, que partiu aos 40 anos de idade e foi um relacionamento que acrescentou muito na minha vida. Outros relacionamentos foram fugazes, então prefiro não mencionar,  por não serem pertinentes no momento. 

Mas voltando ao assunto principal do Post, as vezes também tenho hiperfoco em certas coisas, comportamento que vem desde a minha infância. E tenho algo, que um dia tentei explicar aqui, e não consegui direito (que chamei muito erroneamente de "Preguiça Patológica", devido a culpa que sentia e que me imputavam meus pais), que agora sei ser parte da minha Disfunção Executiva. A disfunção executiva é uma das piores partes, pois quando ela está muito exacerbada me vejo com dificuldade até nas rotinas mais básicas, mas atualmente, com a configuração medicamentosa que estou, ela está um pouco mais controlada. 

Mas enfim, esses são alguns dos motivos pelos quais acredito ser autista.  Tem outras características que poderia citar, mas a postagem já está enorme e eu estou cansada de escrever, por isso fico por aqui. 

Só finalizo dizendo que estou tentando conseguir fazer uma avaliação neuropsicológica desde 2020, mas não tenho como pagar e estou tentando pelo SUS, mas meu psiquiatra do SUS me disse que essas avaliações não são feitas pelo SUS, só em casos muito específicos. Então não sei o que fazer. Pois acho que seria importante tirar isso a limpo, mas meu pai disse que eu não sou autista e não deixa nem eu falar no assunto. Ele se recusa a aceitar que eu possa ser autista. Portanto, por enquanto, fica apenas aquilo em que acredito. E por hoje é isso.  Desculpem um texto tão longo (e mesmo assim faltou coisa), mas deixo um beijos aos que lerem. 
Trazer à Luz... ››

sábado, 3 de setembro de 2022

Quando Desisti de Ser Trans e Meu Primeiro Beijo

 Quando eu tinha entre 3 e 7 anos, acredito que foi o período que comecei a, digamos assim, performar minha identidade de gênero. De uma forma infantil e instintiva, percebi que minha principal identificação e afinidades não eram com pessoas do sexo masculino, mas sim do  feminino. Meus modos, interesses, maneira de fazer muita das coisas, como desenhar e brincar eram também de uma forma na época considerada tipicamente feminina, se formos analisar os estereótipos de gênero mais padronizado que vigia na época. E meu pai notava isso e não gostava nada. Não permitia que eu brincasse de bonecas e, quando aprendi a desenhar e fiz minhas próprias bonecas e princesas de papel, que eu recortava para brincar e guardava cuidadosamente num saquinho transparente, ou quando aprendi com minha tia, a mesma que me ensinou alguns dos primeiros traços de desenho que depois fui aprimorando, a desenhar bonecas para vestir, desenhando com esmero elas de sutiã e calcinha e as roupinhas com abinhas que se dobravam atrás da bonecas, meu pai rasgava elas. Eu já contei isso na minha última postagem, mas volto a esse ponto pois isso me marcou muito, já que por diversas  vezes me dediquei ao trabalho de criar essas bonecas, e tentar escondê-las de meu pai, mas ele sempre acabou achando e elas sumiam. Minha mãe eu lembro que me dizia para guardar onde ele não achasse, mas esse lugar não existia. Ele fez isso tantas vezes que acabei desistindo de recortar as bonecas que desenhava para brincar. Assim, continuei a desenhar, mas então comecei a fantasiar as brincadeiras e histórias apenas na minha mente. 


Algumas vezes, quando via minhas primas, tentava brincar de bonecas com elas, mas quando os adultos me viam com uma Barbie era certo que haveria uma reprimenda e portanto não dava muito certo a brincadeira. No geral eu era uma criança bastante solitária, sem amigos, pois sofria bullying desde muito cedo e acabava ficando um pouco isolada em espaços com outras crianças estranhas. O bullying, adivinhem, era LGBTfóbico e apesar de as vezes sofrer de alguns primos isso também, no geral eles me integravam às brincadeiras. Também tenho dois irmãos, um mais velho que durante a infância era abusivo e um mais novo, com quem sempre brinquei muito. Mas no geral nessa época eu era meio solitária se não fosse pelo meu irmão. 


Também nesse período, lá pelos 6 anos, dei meu primeiro beijo. E foi num menino. Lembro que ao lado do prédio onde eu e minha família morávamos tinha uma colégio com uma pracinha no pátio da frente, com uma daquelas casinhas pequenas que a crianças consegue entrar, e eu e um menino negro, estávamos nessa pracinha brincando. Realcei o fato de o menino ser negro pois eu me sentia atraída por meninos negros. Digo atraída no sentido de me aproximar. Creio que por no endereço que morávamos anteriormente, ter sido vizinha de dois meninos irmãos negros que eram o mais próximo de amigos que tive na época, pois brincávamos juntas e as vezes eu ia na casa deles. Isso num bairro super família que vivíamos antes de eu completar 5 anos. Também notei hoje, analisando, que algumas vezes eu acabava tendo aproximação com crianças que de uma forma ou outra acabavam sofrendo algum tipo de bullying ou rejeição. Muitas vezes negros também tem lidar alguma espécie de preconceito e discriminação desde a infância, inclusive no ambiente escolar e talvez isso gerasse uma certa identificação. Digo isso pois nessa mesma época, no ano anterior se não me engano, quando estava no Jardim B, havia passado um período, que achei maravilhoso, "amiga" de um colega, também negro, que estava com catapora e que por isso ninguém queria se aproximar. Não entendam mal, não estou dizendo que eu era uma santa por isso, e nem que ficava feliz por ele estar com catapora, mas eu era isolada pela turma, ele estava sendo também, achei natural brincarmos juntos e pensei ter feito um amigo. Porém depois que ele melhorou eu lembro que um dia fez bullying comigo junto com as outras crianças e eu vi que a amizade não havia durado. Entendo que talvez tenha sido por pressão social para ser aceito, mas o fato é que fiquei muito magoada e lembro disso até hoje. Mas voltando ao beijo, um ano depois, com 6 anos, eu estava brincando com outro menino negro que parecia gostar de mim e de quem eu gostava também e lembro que nós entramos na casinha da pracinha e não sei se estávamos brincando de casinha, tipo pai e mãe ou o quê, mas acabamos dando alguns beijos selinho ali e depois atrás da casinha. A sensação foi vagamente estranha e maravilhosa. Foi aqueles beijos bem infantis mesmo, onde nos inclinamos para a frente e fazemos biquinho, mas tudo muito inocente. Lembro que tinha algo a ver com a brincadeira e que foi muito bom, só isso. Porém eu não sabia que meu irmão mais velho viu. Ele estava por perto (o prédio onde morávamos era ao lado) e estava me espionando e me disse para parar e avisou que ia contar para meu pai. A partir daí não lembro do que aconteceu logo a seguir, pois eu tinha noção de que estávamos fazendo algo secreto, escondido, talvez "errado", só não tinha noção de qual o grau da infração. Mas lembro que fiquei assustada pelo jeito que meu irmão falou e pelo menino ter ficado asssustado também. 


Acabei tendo que ir para casa, fiquei 15 dias de castigo sem poder sair para brincar e fui proibida de brincar com o menino, tipo, pra sempre. Além disso recebi uma reprimenda heteronomativa e LGBTfóbica que me ensinou que aquela era uma das infrações mais graves que poderia haver. Não me lembro se dessa vez apanhei, mas lembro que fiquei muito impactada pelo resultado de um gesto de afeto entre duas crianças. E assim e o menino com quem tive meu primeiro beijo fomos afastados para sempre sem que eu entendesse muita coisas além de que a forma como eu era e as coisas que eu sentia eram erradas. Pois apesar de não me recordar exatamente daquilo que foi dito para mim, sei que que a conversa passou pelos tópicos gênero e sexualidade (tu é um menino, menino não beija menino, essas brincadeiras não são de menino, tu tem que se comportar como menino...) e aos seis anos de idade eu fui parar numa psicóloga. Meu pai, antigamente, dizia que me colocou na psicóloga para ver o que tinha de errado comigo. Pelos motivos que citei no início, as coisas "de menina" que eu fazia. Coloco entre parênteses o de menina, pois hoje sabemos, pelo menos pelo que entendi, que não é necessariamente o gênero que define o comportamento e nem o comportamento que necessariamente define o gênero. É tudo muito subjetivo. Mas meu pai queria que ela resolvesse o que estava errado. Hoje ele diz que era para eu aprender a lidar aquilo, mas durante anos o discurso foi esse outro. Com o tempo e muita conversa ele acabou entendendo que eu era daquele jeito e pronto. Mas a verdade é que houve muitas tranquilizações, ao longo dos anos que aquilo não queria dizer que eu fosse viado ou transexual. E eu ficava sabendo sobre essas conversas deles com minha psicóloga. Não me entendam errado, a minha psicóloga era ótima, me acolhia e me permitia ser eu mesma nas consultas. Através dela aprendi a escrever histórias, costurar e finamente tive acesso uma boneca. Era a boneca de uma família de bonecos de pano padrão pequenos , do tipo que os psicólogos infantis usam, e aprendi a costurar lãs na cabeças delas para colocar cabelos coloridos, fazer tranças. Posteriormente elas me deu essa boneca e consegui  guardar ela em casa. Mas era como se pesasse sobre a "permissão", pois meu pai não rasgou ela, a promessa muda de que eu seria um menino cisgênero heterossexual. 


E foi então que lá pelos 7 anos de idade abandonei a "questão de gênero" que fervilhava na minha cabecinha infantil e entendi, frente a toda pressão, que eu tinha que ser menino. Que essa era minha única opção. E na minha cabeça nasceu uma coisa que ia me atormentar pelos 29 anos seguintes, chamada ideação suicida. Pelo menos é como vejo hoje, aos trinta e oito anos, após aos 36 ter conseguido me libertar do monte de amarras que me prendiam e ter resolvido remexer a questão de gênero, ter me assumido como uma menina transgênero não-binária, adotado exclusivamente o pronome feminino e roupas femininas e estar cada dia mais descobrindo minha feminilidade. E isso me dá forças. Durantes anos tive tentativas de acabar com tudo. Mas agora estou libertando a menina que esteve aprisionada por anos numa torre dentro de mim, e isso me fortalece para enfrentar as coisas com um olhar diferente, um olhar de esperança, de alguém que está realmente em busca da plenitude, pois antes, como eu poderia viver plenamente, ser plena, se nem minha real identidade de gênero eu conseguia viver? Claro que ainda tenho momentos de dúvida, depressão e tristeza. Continuo lutando contra outras questões. E as vezes tem questões relativas a transgeneridade, como a transfobia. Quer dizer na verdade, nada muito diferente do que eu já enfrentava, pois sempre sofri LGBTfobia pelo meu jeito pura e simplesmente , nunca por demonstrações de afeto com rapazes ou algo assim. Portanto já era o mesmo tipo de masculinidade tóxica e ódio que jogavam contra mim. Mas agora eu não tento mais performar masculinidade. Eu sou feminina e sinto-me mais forte e feliz para lutar contra o ódio e preconceito. E para me manter bem o máximo possível frente a eles. E a ideação suicida ficou para trás, acredito que para sempre, que a Divindade me ajude para que seja assim. E hoje, meu pai, após 2 anos se negando a aceitar o fato e lutando contra com todas a forças, parece ter entendido que tem uma filha, e que de ela poder ser isso, uma menina, depende a felicidade dela. E ele e minha mãe pouco a pouco a pouco estão aprendendo a usar o nome que escolhi e o pronome feminino para se referir a mim. O nome inclusive eu retifiquei na certidão de nascimento e em todos meus documentos, assim como consegui colocar na certidão de nascimento o gênero como não-binário. Escrevo esse texto para me sentir melhor, compartilhar e quem sabe ajudar alguém que esteja precisando. Fico por aqui. Beijos e obrigada aos que lerem.

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segunda-feira, 4 de janeiro de 2021

A Mulher Que Há Em Mim - Relato De Uma Transgênero Em Descoberta

    Olá gente. Hoje estou aqui para falar de mais uma faceta de quem sou, que, atualmente (e em muitos outros momentos da minha vida), ocupa um espaço gigante na minha cabeça: O meu gênero.

    Recentemente me assumi como transgênero não-binário e muitas pessoas ou simplesmente não aceitaram a ideia (como se isso coubesse a elas!) ou não entenderam o que eu estava dizendo. NORMAL, até relativamente pouco tempo, nem eu e nem uma grande parcela da sociedade estava disposta a pensar ou aceitar que gênero NÃO É sempre algo absoluto ou definido pelas características físicas com as quais nascemos. Mas vejam bem, NORMAL não quer dizer correto, pois quem tem que aceitar-se é a própria pessoa, cabendo aos outros respeitar aquilo que cada um é dentro de sua individualidade como ser humano. Portanto, mais do que na hora de eu, pelo menos, pensar sobre isso e de todo mundo parar de querer dar pitaco naquilo que os outros são.

    Mas, como muitas pessoas próximas que gostam de mim se interessaram por entender do que eu estava falando e pareceram meio confusas, resolvi dar mais uma pesquisada e explicar um pouco daquilo que aprendi sobre a trangeneridade e sobre mim mesma. Pois acho que eu, apesar de uma transgênero não-binária, prefiro ser chamada por pronomes femininos, não masculinos. Mas, também como alguém que se identifica atualmente como não-binária, não renego os pronomes masculinos e deixo, pelo menos por enquanto, a cargo dos outros a decisão de qual pronome usar, até por que, vivo com meus pais, e o meu pai especialmente está sendo difícil (ele, mas creio que também PARA ele) como sempre, e estou gradualmente efetuando as mudanças na minha vida que estão trazendo minha felicidade. Também tem o fato que eu mesma costumo referir a mim mesma com o pronome masculino na maior parte das vezes. Passei 36 anos, devido a diversos fatores, reprimindo meu gênero e as coisas até para mim mesma às vezes demoram a se adaptar. Mas confesso que quando usam o pronome feminino para me designar, apesar de minha aparência não ser necessariamente ou exclusivamente feminina, sinto um prazer secreto e especial. Bom, agora, deixou pelo menos de ser secreto.

    Quando digo que "passei 36 anos", é por que sempre me identifiquei muito mais com o gênero feminino, apesar de me portar como rapaz. O que sabia até então é que era gay e achava que isso fosse comum, mesmo quando descobri que não é necessariamente uma regra e que ser homossexual é uma definição de sexualidade, não influindo, necessariamente, na definição de gênero. Sempre tive mais amigas do que amigos. Apesar de que amigos íntimos tenho poucos, por motivos que pretendo explanar em postagens posteriores. Na verdade diria que sempre transitei e me relacionei mais e melhor com mulheres, não com homens, fossem eles héteros ou gays. Minha identificação com o sexo masculino sempre foi muito mais limitada do que a com a garotas em geral. Quando era criança, me lembro de observar e admirar, desejoso de poder experimentar também, diversos atributos que por muito tempo, ou dependendo da época, são considerados mais tipicamente femininos, como cabelos compridos, maquiagem , adereços como joias ou bijuterias e determinadas roupas. Quando muito pequeno o desejo de experimentar transbordava e me lembro de utilizar camisetas compridas com cintos na cintura dividindo-as, de forma a tentar configurar algum tipo de saia ou vestido curto, apesar de sempre evitar estar perto do meu pai nesses momentos, pois ele já havia me censurado por esse comportamento, ainda que hoje em dia ele diga não lembrar-se disso e que nunca dei nenhum aviso de ser transgênero ou ter essa fascinação e identificação pelo mundo feminino. Permitam-me rir aqui, pois eu me lembro de meu pai rasgando meus desenhos quando eu comecei a desenhar aos 2 anos e lá pelos 3 ou 4 anos tentava retratar princesas de vestidos FABULOSOS e príncipes ENCANTADOS que as salvariam de suas atribulações. Eu também, como ele mesmo conta, "não desenhava como menino e tinha algo de MUITO ERRADO na forma como eu desenhava" as casinhas detalhadas com janelinhas com cortininhas cor-de-rosa e vasos com minúsculas florezinhas coloridas e céus com nuvens fofas e sol com carinhas felizes, ao invés de desenhar carrinhos, naves e soldadinhos ou guerreiros como meus irmãos faziam. Eu até desenhei guerreiros, na verdade, quando mais velho, mas na verdade era normalmente um guerreiro encarregado de proteger um lindo, porém delicado e frágil, "príncipe", já que eu não podia ser princesa na minha imaginação, como já então era nas minhas mais secretas (ou não) fantasias internas. Assim fui crescendo e me reprimindo cada vez mais na questão de gênero, enquanto tentava a todo custo me encaixar na figura masculina que deveria, mas sempre falhando miseravelmente apesar de na maior parte do tempo me vestir com roupas de rapaz e algumas vezes de menino.

    Na adolescência, me assumi primeiramente como bissexual para meus parentes, e tenho que rir aqui pois, na verdade, minha única namorada de verdade foi quando tive 9 anos e apesar de nos beijarmos no sofá da casa dela, meu momento preferido, não por culpa dela, que era linda e uma querida, (lembremos que ambos eramos crianças) era quando íamos brincar com suas Barbies e apesar de ela querer que eu fosse o Ken, minha "namorada" generosamente me emprestava a Barbie noiva, ou a Barbie grávida (lembram, a que tinha um bebê na barriga postiça que podia ser retirado de lá) para que eu pudesse me sentir mais feliz na brincadeira. Isso durou um ano e lembro-me que a mãe e a vó dela me adoravam, e todos os dias me davam um lanche sempre muito aguardado e que nunca implicava em nenhuma cobrança, pessoas generosas que eram, permitindo-me viver coisas que talvez eu não pudesse viver em nenhum outro lugar além daquele. E a verdade é que na época de minha adolescência eu me assumia para mim mesmo e para minhas amigas como gay, não como bissexual, tendo sido isso apenas um subterfúgio por medo da reação de meus pais, principalmente da de meu pai. Até fiquei com algumas meninas, no início de minha adolescência, mas, na verdade, ainda que eu admirasse suas belezas físicas ou apreciasse suas companhias, quando não estávamos tendo que nos beijar, foi por uma parcela muito pequena de experimentação e na maior parte por ter cedido às pressões sociais, infelizmente, para mim e para elas, pois inevitavelmente, se havia algum tipo de sentimento mais sério por parte delas, ambos sofríamos. Mas também não foram muitas e na maior parte das vezes eu procurava, dentro do possível para um adolescente na minha situação, preservá-las de sofrimentos maiores.

    Então, quando "me assumi bissexual" houve uma grande rejeição de meu pai que, desde que eu era muito novo, mantinha enorme afastamento sentimental de mim e com quem eu tinha muitos conflitos por conta disso há um longo período. Ele, na maioria do tempo, esteve presente apenas como o provedor da casa em relação a mim e realmente me forneceu o necessário para minha sobrevivência e às vezes um ou outro supérfluo ou presente. Era certa sua quase total ausência na área afetiva e suas posturas e atitudes extremamente brutas e ignorantes, quando era chamado a esse papel. Ele estava presente fisicamente, algumas vezes, porém mais como uma figura de julgamento e condenação, não como um pai de verdade. Eu tinha apenas um 3 em 1, um banco, com todas as posturas unilaterais e "desinteressadas" (Faça-me rir) de um banco, uma espécie de "rígida" polícia da "moral e bom costumes" e por fim um juiz parcial, preconceituoso e quase sempre intransigente. Só que isso tudo cobrou de mim um preço muito alto na construção da minha inteligência emocional e de muitos outros setores da minha vida. Eu FIZ terapia desde os 6 anos de idade, mas não tem 1 ou 2 horas de terapia por semana que substituam a presença AMOROSA E AFETIVA de um pai na formação de uma criança ou adolescente. Hoje entendo um pouco de suas limitações, MAS isso não muda a realidade que vivi também e que, assim como a DELE, o levou a agir da forma que agiu comigo, levando-me a enfrentar inúmeras coisas que talvez não tivesse que ter enfrentado de outra forma.

    E esses foram alguns dos motivos que me fizeram levar 36 longos anos para sair da prisão de medo, repressão e preconceitos imputados a mim e assumir minha transgeneridade. E como podem ver ainda uso o gênero masculino para referir-me a mim mesmo, principalmente quando estou lidando com meu passado, pois querendo ou não durante muitos anos assumi o papel de um menino. Não de um homem, vejam bem, mas de um menino, um menino forte, possuidor de beleza, sensibilidade, mas também justamente por isso, de muitas falhas e fragilidades que o levaram a errar e cair algumas vezes no caminho. Que se recusava a crescer, pois se crescesse e se tornasse um homem, estaria se mutilando, amputando de si talvez a parte mais bonita que possuia e de onde se originava e ainda origina a maior parte da força para ter conseguido sobrevir por esses 36 anos: A mulher que há em mim. 

    O menino no momento ainda existe e passou por muita coisa, porém no momento, quem está desabrochando, como uma flor às vezes consegue surgir em meio à adversidade e dar sua beleza para o mundo em um momento tão difícil, mas também tão lindo, como está sendo esse na minha vida, é essa mulher tão bela e resiliente, como algumas vezes certas flores de rara força o são.

    E é essa mulher que eu hoje celebro, e esse menino também, que foi tão necessário na minha jornada e que me mantiveram vivo até agora, tendo conseguido transpor todos obstáculos e dificuldades que acabei encontrando nesse mundo muitas vezes tão árido e sem cor em que vivemos.

        Porém agora cansei de escrever e creio já ter escrito o suficiente para uma postagem, por isso fico por aqui, me despedindo e avisando que pretendo voltar ao assunto numa próxima postagem para tentar explicar um pouco sobre minhas descobertas relativas a classificação de transgênero, não-binário, se é que não-binário é a classificação correta definitiva, pois estou em processo de descobertas e não estou fechando questão sobre assuntos referentes a gênero, exceto na parte da trangeneridade. Essa é uma certeza, que só tive a coragem e compreensão para aceitar agora, mas que Graças à Deusa, a Deus e a minha força, estou aqui para aceitar e lutar por ela. Por quem sou na minha essência mais profunda, forte, bela e resiliente. Beijos aos que lerem.

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terça-feira, 5 de novembro de 2019

Irônico

É tão estranho. Se bem que sim, é estranho, mas acredito que talvez irônico seja uma palavra melhor. É incrivelmente irônico que tenha tanta gente com doenças que atacam o aspecto físico, sejam terminais, crônicas, algumas extremamente debilitantes, outras autoimunes, pessoas buscando por aí ou se submetendo a tratamentos para continuarem vivos, gente lutando com todas as forças, resistindo, se negando a deixar que as limitações que a vida impõe a elas impeçam que tenham uma vida normal. Gente que muitas vezes, independente de do quanto lutaram, tem que encarar e aceitar a morte.
E que, enquanto isso, tenha eu. Alguém que mais de uma vez buscou a morte, que mais de uma vez uma vez desistiu de tudo. Que mais de uma vez tomou overdoses ou então grande quantidades de medicamentos, e que a morte rejeitou uma, e outra e outra e outra e outra e outra vez. De acordo com os cálculos dos meus pais foram seis vezes. Eu, para ser sincero, já nem lembro mais quantas foram. Talvez por ter feito sessões de ECT que me deixaram lacunas horríveis em minhas memórias, ainda que, lentamente, esteja tudo me voltando agora, que nem diz na música da Celine Dion. Mas, na realidade nem tudo está voltando. Nem todas lembranças voltam com todos os contornos definidos. Algumas lacunas permanecem, ainda que eu não saiba por quais critérios são escolhidas as que ficam comigo e as que vão para o limbo do esquecimento. Ou se as que vão, voltarão algum dia.
E a verdade é que não existe esse motivo plausível para que os outros compreendam, essa razão concreta para eu querer tanta assim morrer. Há GATILHOS, mas não uma verdadeira motivação que eles considerem palpável, crível. Óbvio que o sofrimento existe, mas ele existe também para tantas outras pessoas... E, já que meu sofrimento em si é uma doença, ainda que invisível aos olhos, ela só se manifesta fisicamente quando eu provoco essa manifestação. Quando eu me corto ou tomo uma quantidade absurda de remédios, e observo, como se o mundo estivesse em câmera lenta, o sofrimento nos olhos de outras pessoas por quê, naquele instante, ela realmente veem meu sofrimento. Ele está estampado em mim e eles não tem como negar que há algo de errado.
Claro que sempre tem aqueles que desejam que eu tivesse conseguido meu objetivo com a overdose, ou que os cortes tivessem sido mais fundos ou no sentido certo para que eu sangrasse até morrer.
Eles não entendem. São demasiadamente obtusos. Existe dentro mim mais de uma entidade: Existe a que está aparentemente sob controle, ainda que seja “só por hoje”, que é a dependência química; Tem também e doença que mencionei antes, que me faz querer morrer, querer desistir de tudo, me machucar, sumir, deixar de existir completamente, tudo para acabar com o sofrimento, o mesmo sofrimento que citei, que os outros não veem ou entendem; E, por fim, tem eu, que lutei boa parte da minha vida contra a primeira, e praticamente a vida inteira contra a outra.
Uma luta extramente inglória e ingrata, pois quando venço essa luta, acham não fiz mais do que minha obrigação em continuar vivo. E nas vezes que o sofrimento chega a um nível insuportável, e acabo sendo nocauteado pela doença, desistindo, me deixando guiar por ela e me machucando mais do que apenas emocionalmente, as pessoas me julgam e condenam. Se eu morresse, diriam que fui fraco. Mas como mais uma vez sobrevivi, por eu seguir vivo, dizem que sou sem vergonha, vagabundo, manipulador, fraco, também, e que eu não queria morrer. Estão certos, em parte. EU não quero, mas as outras entidades que povoam meu interior, pensam diferente. A dor, a vergonha, minha autoestima destruída por todos os anos de ódio gratuito que jogaram, impuseram, enfiaram em mim, e também minha herança genética, pensam diferente. Sei que deveria me fortalecer com todos esses anos de ódio, exclusão, humilhações, e torturas psicológicas, e me fortaleço, mas não cheguei a um nível onde joguem pedras em mim e não sinta a dor. Cada uma delas me atingem e sinto onde me atingiram, e sangro. Sim, eu tento fugir, mas aqueles que jogam as pedras estão em um círculo em torno de mim. Portanto, acabo, mesmo que não queira morrer, deixando que a doença guie minhas mãos, as quais pegam os remédios em um punhado, depois enchem um copo de água para eu beber e continue, punhado após punhado, até não haver mais nenhum. Até chegar ao nível tóxico. Depois fique uma quase uma hora chorando na escuridão, temendo a chegada do Anjo Negro que irá me levar uma escuridão maior ainda, rezando a Deus para que Deus, ou outro lado, ou céu, ou inferno, para que nada disso exista. Que eu apenas me desfaça lentamente até não haver mais nada de dor, de medo, de ódio, de sofrimento. Até não haver mais nada de mim para ser julgado pelo mundo.
Mas não é irônico? EU fiquei aqui, mais uma vez, aparentemente sem sequelas, enquanto pessoas com doenças que destroem seus corpos, pessoas que lutam contra com todas as forças para ficar, que se agarram à vida com tudo que tem, acabam perecendo, sem chance, sem possibilidade de que os esforços delas resultassem em algo. Talvez, se eu tentasse de novo, não fosse assim. Mas não é o que eu quero. TEM QUE HAVER UM SENTIDO. Tem que haver um PODER SUPERIOR. Seja Deus, Deusa ou que nome as pessoas derem a ele. Tem que haver algum sentido para tantos partirem e eu estar aqui.
A verdade é que após cerca de quarenta minuto minutos sentado no sofá, no escuro, tentei pesquisar no Google para confirmar que a dose de medicamentos que tomei era letal ou tóxica, enfim, se ia me matar. Eu sabia que era, mas havia algo de errado. Eu estava vivo. Para minha surpresa, quando fiz a pesquisa, obtive o resultados, mas apareceu no topo da página, um telefone, o 188, Centro de Valorização da Vida. E o meu eu saudável, desesperado com o que meu eu doente havia feito, ligou e pediu ajuda, tendo sido salvo por um anjo em forma humana, com quem provavelmente jamais falarei novamente, mas que me escutou, não me julgou, me orientou e que depois de me conduzir de volta ao mundo dos vivos que querem viver, com sua delicadeza, empatia e sensibilidade, me orientou como proceder para não acabar morrendo. E continuou a me ouvir, me sondando sobre a quem eu podia recorrer, até que no fim resolvemos o que fazer e liguei para a pessoa que foi na minha casa e me levou ao Pronto Socorro, onde fiquei por sete dias.
Faz oito dias que saí de lá e só consigo até agora ver a ironia de tudo isso. O sentido ainda não está claro. Não sei se um dia estará. Mas quero buscá-lo. Tem que haver um, ainda que talvez eu só o conheça quando partir desse mundo. Sim, falo de quando eu morrer. Não é o que quero agora. Morrer. Quem sabe um dia, provavelmente, mas, se tudo der certo, não será por minhas próprias mãos.

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quarta-feira, 11 de abril de 2018

Peso Morto


EU sou um peso. Um peso morto. É como eu me sinto em relação a vida. MORTO. E um peso.  

Nada realmente tem sentido. Nunca teve para mim.  Talvez por isso tenha tentado sempre fugir dela a todo custo. Seja por meio das drogas ou tentando suicidar-me.  
Não posso aguentar mais ECTs. Não posso mais esquecer e viver a vida como um bobo alegre. Mas também não aguento conviver com os sintomas e as implicações da minha doença. Ou com a verdade, pois não sei mais o que é o que. Tudo parece a mesma merda. Realidade se mistura com mentiras que minha mente me conta. Isso, caso sejam mentiras. Elas fazem eu ter vontade de machucar as outras pessoas e,  como eu não posso, não consigo fazer isso, ela faz como que eu resolva me machucar.
Como poderia eu me defender de mim mesmo. Quem ia lutar contra quem. Pois sou um só. A doença já faz parte de mim. A doença é o que eu sou. 
As pessoas, principalmente meu pai, perguntam por que pinto mais quadros sombrios, do que alegres. É por que pinto sobre minha vida. E minha vida é a doença. Ainda que esteja um sol lindo brilhante, e eu esteja sorrindo, num lindo jardim, com lindas flores coloridas e arbustos, e um lindo gramado e lindas e frondosas árvores com folhas de um lindo e vivo verde, isso é por fora. O sol ilumina minha superfície, mas por dentro, só há sombras. As sombras estão sempre dentro de mim. E minha única chance, é colocá-las para fora na minha arte. Só assim permanecerei vivo. Só assim, elas não irão vencer. Ainda que não seja o que parece quando o quadro está pronto, ele evita que a escuridão se propague ainda mais. Que eu seja completamente consumido por ela. Minhas obras, principalmente as escuras e sombrias e tétricas, geram a única luz que consegue iluminar o que carrego dentro de mim. Iluminar os recônditos escuros da minha alma.
Digo que sou um peso, pelo fato bem simples de eu não ter estabilidade ou constância para me sustentar e gerir minha vida. Preciso ficar dependendo de outras pessoas. Sim, eu sei que todos de um forma ou outra dependemos de outras pessoas, mas falo de depender completamente. Se meu pais morressem hoje, eu estaria completamente desamparado. Talvez meu irmão mais novo tentasse me ajudar, só que isso seria mais humilhantes ainda do que depender dos meus pais. Tem gente que me acha um sem vergonha, bem, que não se preocupem, eu sinto vergonha, apenas não costumo externá-la. Seria dar munição ao inimigo. Que inimigo? O mundo. A sociedade. 
Como disse sou um peso. Um peso morto. Também chamado por outros nomes, presente em tantas frases do meu pai, que eu finjo não saber que serem direcionadas a mim, assim como ele finge não se referirem a mim: Vagabundo. Marginal. 
Ou outras palavras que vejo formarem-se no olhar de tantas outras pessoas, ao falarem comigo: Retardado. Louco. Maluco.
Mas me chamo de algo diferente.
UM PESO.
Um peso, como vai acontecer com todo mundo um dia, MORTO.
Só que no meu caso é em VIDA. Até eu resolver aliviá-los.

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sexta-feira, 25 de novembro de 2016

Silêncio



Lá, ou  pouco depois de lá.
Após tudo que enfrentamos aqui.
Quando finalmente chegamos
Ou achamos ter chegado ao fim

Costumamos (fingir) pensar haver um paraíso
para onde iremos,
Quando pensamos que acabará
nossa cegueira habitual.

Realmente enxergamos, mas
Só há breu
Ausência de luz.
Há apenas escuridão.
O negror de nada ver.

E nos perdemos em nossas palavras.
Pois as pronunciamos mas nada sai.
Apenas nossa mudez, que preenche
todo o vazio invisível  ao nosso redor.

Onde não  há a surdez, mas mesmo assim
não ouvimos, pois não há o que ouvir.

Onde há apenas o Além.
Onde há apenas a escuridão.
Onde há apenas o silêncio inquebrantável.
O Silencio ensurdecedor.
Que causa tamanho desespero que pedimos,
em silêncio
Sem nem mesmo nossos pensamentos ouvir
Para escutar algo, qualquer coisa.
Não importa o que

E então surge aquela vozinha,
A lhe sussurar no ouvido,
Coisas que só você consegue distinguir
E entender.

E se você acusar que ela está ali
A sua solidão, a incompreensão e ignorância alheia,
O pacto, está tudo selado.
Pois você está no além.
Além da razão.
E o que você ouve, é a insanidade.
O que você ouve é sua nova melhor amiga.
O que você ouve
É a loucura


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quinta-feira, 3 de novembro de 2016

Medo da Escuridão



Sempre tive medo, não, medo é pouco. Sempre tive pavor da ESCURIDÃO. Assim mesmo, em maiúsculas. Creio que temia por quê, de alguma forma, sabia de antemão que seria engolido por ela. Que ia afundar num lodaçal até sumir na ausência de luz. Que os fantasmas e demônios que a habitam iriam me escravizar, torturar e corromper. Que iriam me enlouquecer e que, se é que isso era possível, deixariam (e deixaram) a escuridão mais negra, sombria, violenta e sádica do que nunca. Que, a partir de então, meu mundo não teria mais cor, brilho ou luz. E o mundo que me sobraria seria feito de paranóia, tristeza, dor e medo.

E lembranças. De tudo que sofri e que só quem sofreu também consegue entender. Os abusos ininterruptos que vivi, até eu me achar um lixo. Até eu realmente achar que valia menos do que nada, que não valia porra nenhuma e começar meu processo de auto-destruição. Algo que quase consegui.

Alguma coisas consegui destruir:

  • Minha crença na bondade humana;

  • Parte do meu amor próprio, da minha auto-estima;

  • A confiança nos homens;

  • A confiança nos meu pais;

  • A confiança no mundo;

  • O Bom funcionamento da minha mente;

E por último, mas não menos importante, MEU SONHOS.

Hoje tenho que lutar contra a loucura, para não ser completamente engolido por ela. Para dar ouvidos aos pensamentos sensatos, não à paranóia.

Eu achava que o tratamento que estou fazendo agora, o ECT, me ajudaria a voltar à luz. Mas descobri que ele apenas tenta me ensinar a enxergar no escuro. Mas sou engolfado pelo desespero ao perceber que até isso exige uma força enorme, que já eu tive, antes de a vida me corromper, mas que agora acho que não tenho mais.

E percebo que morro lenta e dolorosamente, o que me causa a dúvida se não seria mais misericordioso comigo mesmo, morrer tudo de uma vez só. Acabar com todos os sofrimentos, ao invés de ser obrigado a saboreá-lo gradualmente.



Partir.
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segunda-feira, 31 de outubro de 2016

Déjà Vu (Repetindo Minha Vida)



E minha velha e boa ideação suicida, está de volta. Agora, após os 12 ECTS, achei que não ia sentir nada negativo, ou pelo menos que iam diminuir meus sentimentos depressivos, minha angústia, minha ansiedade, minha insegurança e minhas paranóias. Ou melhor, que iam diminuir os sentimentos depressivos, a angústia, a ansiedade, a insegurança e as paranoias. Pois não quero que elas sejam minhas. Quero que elas não me pertençam mais. E, como disse, achei que iam diminuir. Mas agora parecem estar de volta.

Tenho tido muitos “déjà vu”. E começo, depois da repetição de acontecimentos e situações ficarem muito comuns, a duvidar de que sejam realmente “déjà vu”. Começo a pensar que estou realmente revivendo acontecimentos. Que de alguma forma voltei ao passado e que estou repetindo coisas que já vivi.

Idéias aparentemente insanas pipocam na minha cabeça. E se o ECT de alguma forma faz com que voltemos no tempo? Mas daí meu raciocínio lógico pensa: Então eu não lembraria de ter feito os ECTs.

Mas a ideia mais forte é a de que minha família está em um complô contra mim, por algum motivo. Talvez por me acharem vagabundo. Talvez para fazer eu me tornar mais resistente às frustrações, paranóias, tristezas e por aí vai, então eles criam novas para me testar. Só que todos esses pensamentos me fazem pensar que eles são meus inimigos, e fico sem saber em quem acreditar.

Me dá uma imensa vontade de chorar, um desespero de não saber se posso confiar em alguém. Se devo pegar alguém, como meu irmão, que acho que não faria isso comigo, por exemplo, para perguntar sobre se alguém tentou fazer ele participar dessa farsa.



Por fim, como é de se esperar de mim, me dá vontade de acabar com tudo. De tomar uma nova overdose de remédios, ou pular de um prédio, ou dar qualquer jeito de acabar com todas essas loucuras e insanidades que ameaçam engolfar meu cérebro. Penso então que o melhor meio, é deixar de existir totalmente. Ir embora dessa porra de mundo desgraçado.
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sábado, 1 de outubro de 2016

Velhice (Pelo Que Viver?)

Pelo que viver? Por que motivo devemos continuar, se na maioria das vezes há tanta escuridão no futuro? Se o FIM é quase sempre tão escuro, sombrio e ingrato.

Minha avó, tinha tudo. E batalhou e trabalhou muito, assim como meu avô, para ter tudo que tinha. Ela é poeta. Alguém que, mesmo sem entender direito meus escritos que, na minha adolescência, eram de certa forma tétricos e lúgubres, sempre me estimulou a continuar escrevendo, seja lá o que fosse. Mas como eu dizia, ela tinha tudo, mas hoje, por ter chegado aos 92 anos, tem quase nada em comparação com antes. Hoje, como diria a Dido, na música Life for Rent, nada do que ela tem é realmente dela. Até o final do ano passado, ela tinha o maior de todos os bens, alguém que a amava incondicionalmente. Meu Avô. Mas ele sucumbiu. Morreu no final do ano passado. E ela ficou sozinha nesse mundo. Tem uma casa enorme, um bom carro, muitos bens, mas sem poder usufruir, inclusive dessa casa onde não pode morar pelo fato de casa ser enorme, por não poder mais ficar sozinha, enfim, pelo fato de ter chegado ao 92 anos.

Tentei o suicídio no dia 20 de setembro. Estarei eu realmente tão errado por isso?

Estou de volta, temporariamente a casa de meus pais, pelo menos até terminar as 4 semanas de ECT. A casa dos meus pais é de dois quartos, então, temporariamente, estou nesse quarto, que é onde minha avó mora atualmente. Onde nada que ela ela tem é realmente dela, e quando nada do que é realmente dela, ela realmente TEM. Eu entendo por que ela queira dormir o dia inteiro. Do por que fica deprimida. Não é por ela ela estar cansada. É por estar limitada pelo físico. Pois mesmo com seu cérebro falhando um pouco, mesmo ouvindo muito pouco, ainda há nela a poeta que quer ver o lado bonito da vida e criar odes a ele. Que quer ter sua própria vida e tocar de novo o amor palpável que existia, e acho que existe ainda, entre ela e meu avô. É sentir a presença e não só espiritual do meu avô.

Então hoje, acordei muito cedo e vi ela deitada tão pequenina em sua ancienidade, tão fragil em sua velhice, e entendi por que, apesar da casa ser da mãe, minha avó tenta dar ordens aqui também. Pela primeria vez consegui REALMENTE, colocar-me no lugar dela. Ontem enquanto tirava da mesa, após o jantar, disse a ela que não precisava listar o que devo tirar ou não da mesa, já que eu já fizera isso muitas vezes. Disse isso, mesmo que sem falar de forma agressiva, por que fiquei irritado. Mas agora entendo. Aí está ela, frágil e não mais realmente dona da sua vida. Não mais realmente dona de nada. Seu dinheiro, ela guarda. Usa uma parte nas depesas, como uma ajuda a minha mãe já que mora aqui agora. O resto, ela guarda. Para que, eu não sei. Minha mãe quer que ela contrate uma cuidadora, já que isso seria realmente importante para o bem estar da minha avó na sua atual idade. E talvez seja esse o problema todo. Talvez, ela guarde dinheiro, para não aceitar sua idade. Acumula, que foi o que fez durante grande parte da vida, para acreditar que tudo continua igual. Que existira um amanhã, mesmo nesse momento em que tudo é ainda tão incerto.
Então me vem a dúvida. PELO QUE NÓS VIVEMOS? E o que realmente possuímos? A única resposta que me ocorre, é que vivemos pelo amor verdadeiro. Pois o resto não é eterno. E sabendo disso, finalmente entendo a frase da música da Dido:
“Nothing I have is truly mine.”


Mas, para ser completamente honesto, não entendo é nada. Apenas sou alguém que tento encontrar algum sentido nessa mixórdia toda chamada vida. Alguma razão. Algum motivo para continuar vivendo. Para não dar um fim a tudo. Para lutar. Para não ceder à minha estupidez chamada de loucura. E, principalmente á forte companheira que vive comigo faz tantos anos: A Ideação Suicida.
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domingo, 25 de setembro de 2016

É A Sensação



É sensação de ser vitorioso.

De que todo mundo que poderia atrapalhar está longe ou tranquilo em relação a mim.

De que se eu tomar aquelas duas caixas de Rivotril, em casa, sozinho, ninguém vai me impedir.

De que ninguém vai me juntar do chão caso eu caia, que poderei me afogar no vômito, se vomitar, e ninguém vai impedir.

É a sensação de ter coragem, e sangue frio.

De ter tomado pela primeira vez na vida uma decisão de verdade e de ir com ela até o fim.

É sensação de que as vozes e risadas de escárnio vão parar.

É a sensação de que a dor e a culpa pelo fato de estar vivo vai cessar de existir.

É a sensação do zumbido de uma mosquinha dizendo que se tudo isso é verdade, por que não tomei junto com as duas caixas de Rivotril, todos os meus remédios da semana que pegara, naquele mesmo dia, com meu pais.

...covarde. Covarde. COVARDE.

É a sensação de que a própria ideação suicida, é covardia.


Uma espécie banal e medíocre de rebeldia. Uma preguiça de lutar. Sim, sou vagabundo assim como sempre disseram. Tenho PREGUIÇA PATOLÓGICA DE LUTAR.

Mas tenho um motivo. Nada nunca é o suficiente. Talvez hoje em dia, seja o suficiente para vocês e vocês achem que com o tempo irei evoluir. Mas para mim não é o suficiente. E meu cérebro, que comando isso tudo, me manda esses sinais o tempo todo. Não de que não sou capaz, mas de que sou, mas sou um vagabundo, marginal, (palavras tiradas do repértorio do meu pai) ridículo, cômico, digno de riso e escárnio e por isso não conquisto porra nenhuma.


É a sensação de que nada que faço, tem algum valor. Seja uma música, seja um texto, um livro, um desenho ou uma pintura.


É a sensação de ser um traste imprestável. Eu luto, luto, luto contra tudo isso e quem me vê, acredita que tenho um super auto-estima. Só que feita do mais fino vidro que você podem imaginar. E uma risada, ou palavra, ou crítica, mesmo que seja na casa do vizinho, mesmo que meu ouvido não distingua o que dizem, meu cérebro se encarrega de interpretá-las e reduzir minha auto-estima ao pedaços. Não vou entrar nos porquês. Eles não importam mais.



A questão é que mais uma vez fiz uma roleta russa. Depois de tomar os remédios, dormir desde terça-feira de tarde até quarta-feira de tarde. Fui acordado, pelo telefonema da minha mãe. Pela milésima vez ela me deu a vida. Claro, não sei se acabaria morrendo caso não tivesse havido a ligação. Não sou médico. Abaixo um trecho da carta que tentei escrever quando tomei os medicamentos. Uma parte acho q que meu cachorro comeu. Da carta, não dos medicamentos.

Tadinhos, quando tomei a superdose ambos vieram ficar do meu lado.  Minha linda gata branca Lana e meu cachorro mesclado Toddy. EU disse a eles e sabia que iam cuidar deles, mesmo que sentissem minha falta. Mas confesso que não pensei muito nisso quando fiz a tentativa. Egoísmo. Suicídio é a maior mistura de egoísmo e altruísmo que existe. Egoísmo por que queremos acabar com a NOSSA dor, trabalho e sofrimento. Altruísmo por que vamos, de uma vez por todas, parar de dar dor, trabalho e sofrimento para a as outras pessoas. Mas vamos lá.



“A CARTA:

Um Fim


Desculpem.


DESCULPA, PERDÃO



Mas nunca fui muito bom em queda de braço. Está certo, vocês venceram. Eu, na verdade nunca quis realmente lutar. Só ser salvo. Queria apenas encontrar um príncipe que me levaria em seu cavalo para o felizes para sempre. A vida não é assim. Hoje eu sei que o felizes para sempre não existem. É algo que depende de nós. |É uma luta diária. Ou talvez apenas algo inventando para as pessoas conseguirem seguir em frente vivendo. A questão é que não sei lutar. Falta em mim algum componente essencial.

Talvez seja realmente um vagabundo marginal como dizem tanto. Riam bastante agora. Sou um palhaço e no velório do palhaço, esperam-se risos.

Desculpem se não correspondo as expectativas que você tem, tinham ou tiveram para mim. Estou destroçado. Caindo aos pedaços.

Minha suposta “genialidade e talento”, são apenas manifestações dos pedaços de sentimento sem frangalhos restantes, que tenho pela vida e pelas pessoas.

Desconfiança é uma das palavras mais feias que existem para usar com um amigo, mas…”



E essa foi a carta.

Creio que não tive o resto de energia, nem capacidade para terminá-la, pois já tomara todos os remédios.

Havia nela um setor de agradecimentos, mas foi comido pelo Toddy.

P.S.: Apesar de tudo que escrevi, obviamente estou vivo. Feliz ou infelizmente. Mas já que estou aqui, beijos aos que lerem.
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domingo, 11 de setembro de 2016

E Se Eu Dissesse Que Eu Aceito


Música que escrevi em homenagem a todos os babacas ignorantes e pretensiosos que acham que podem julgar e dizer como deve ou não deve ou pensar e agir uma pessoa que tem qualquer tipo de doença crônica, principalmente portadoras de transtornos psiquiátricos.

Para pessoas que pensam que todos tem que ter a mesma reação ao bullying na infância, adolescência e até na vida adulta. Como se todos fossemos iguais, seja na sensibilidade, fragilidade ou qualquer outra característica que vão ditar o que essa violência e abuso psicológico vai causar na vida do jovem perseguido. Quando escrevi a letra, na sexta-feira (09/09/2016), pensava na breve relação apenas virtual que tive com um carinha que na sexta mostrou o idiota e preconceituoso, além de ignorante, que realmente era. Só faltou ele dizer que doença mental e que transtornos psiquiátricos, são frescuras. Querido, Google pra você. Faz uma pesquisa de doença mental, bipolaridade, incapacitação e morte. Tu nem imagina, vai descobrir que existe um percentual enorme de morte por doenças que NÃO EXISTEM! 

Só dou graças a Deus por ter descoberto a tempo tua forma de pensar. Muito fácil dizer as coisas que tu disse, não tendo doença crônica nenhuma. E mesmo que tivesse, tu não teria direito de julgar, já que tu não é eu e não viveu as mesmas coisas que vivi, e o principal,sendo eu. Moral da história, todo mundo é diferente. E em relação a eu estar te julgando, quando te chamo de babaca, ignorante, pretensioso idiota e preconceituoso, é por que, ao me julgar, tu me deu direito de te julgar também.

Mas em relação a letra, também tive, na verdade a maior parte dela, inspiração de alguns relacionamentos abusivos que tive no passado. Graças a Deus agora sou livre . E dedico, agora falando sério, a todas pessoas que já passaram por um relacionamento abusivo e conseguiram se libertar. E esse carinha que conheci, vai em paz, fuma tua maconha, teu cigarro e que Deus te acompanhe. Outra relação abusiva, ou de co-dependência não, obrigado, de nada, beijos aos que lerem (e que ouvirem minha música).




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domingo, 4 de setembro de 2016

A Feira (Cura da Solidão)




Estou me sentindo triste e decepcionado.

Conheci um carinha no BADOO, um aplicativo de relacionamentos, para namoro e pegação. Hoje em dia é mais difícil de encontrar aplicativos só para namoros que tenha algum movimento, não apenas aquelas bolas de poeira do deserto. Pelo menos nos que experimentei. Ou então , mesmo sendo direcionado para namoro, você conhece o cara e a primeira coisa que ele faz é mostrar a foto do pau. Portanto uso esse aplicativo, Badoo, que é diversificado.

Mas daí, esse cara me deu “oi” nesse site de relacionamentos.. A partir daí começamos a conversar e, eu confesso, me empolguei muito mesmo. De verdade e com aquilo que pareciam bons motivos. Ele é um doce. Alto (quase minha altura), Tem a lot de pêlos nos peito (vi pela abertura da camisa dele, é divertido, tendo me feito rir o tempo inteiro desde que o conheci. Quinta feira de noite cheguei a incomodar os vizinhos, pois ri até a hora de dormir. E eu adoro rir, aquele riso genuíno e sem esforço, e isso me deixou muito feliz e ENCANTADO.

Além dele ser bonito e divertido, ele também é artista plástico, com objetivo de cursar artes na universidade federal! Trabalha como gerente numa loja de bebês (own) e, ainda que não o conheça pessoalmente, enxerguei nele (pode estar apenas nos meus olhos e percepção a coisa toda) um sorriso, calor humano, instinto protetor e uma sensação de que estarei em segurança, tudo isso num hard level filho da puta.

Só hoje, sábado, véspera do dia que iamos nos encontrar, após dois dias conversando, íamos combinar a saída. E é claro que imaginei que ficariamos, já que ele também demonstrou com palavras e atitudes, inclusive antes de mim, que também sentia isso, que era recíproco (seria isso aqueles joguinhos babacas que muitos caras fazem?). Ontem a noite cheguei a narrar um “conto erótico” para ele, pelo telefone, para vocês terem idéia. E sabe, talvez seja isso que tenha feito ele mudar a visão de mim, mesmo que injustamente. Digamos que mesmo ele tendo me dito o contrário, ele sente que eu me desvalorizei fazendo o que fiz.

Pois chego a conclusão, depois do que ele me disse hoje, que é tudo um grande mercado, uma Feira.

Não é hipocrisia o fato de eu falar isso, apesar de eu já ter agido conforme esse padrão, pois eu não sinto mais dessa forma e creio que agora enxergo de verdade como é essa coisa de “ficar sem compromisso ou exclusividade”. Sabe? Tu fica comigo, e quando não estamos perto eu fico com outro e cada um fica com quem quiser. 

É como se todos fossem degustadores e degustação ao mesmo tempo. E vão de banca em banca dessa imensa feira humana, degustando, cuspindo o que não lhes agradou, provando pela segunda vez algo que acharam gostosinho (mas não o suficiente para comprar), esperando um dia encontrar aquilo que se quer ter disponível para degustar o resto da vida. Ou até mudar de paladar e preferir procurar algum "produto" mais fresco, novo. 

O que me deixa realmente chateado, é saber que para essa pessoa, que não aceita estar só comigo durante o período que ficaríamos, eu não valho recusar por alguns dias, beijos ou trepadas com outras pessoas.

Algo em mim, sinaliza para ele, que me conhecer, ficar comigo não vale a pena, não vale o sacrificio de abdicar de alguns dias ficando com mais gente.

Mas bom, se eu não valho o sacrifício, fico pensando o que esse texto, principalmente a última parte, e a atitude dele fala sobre ele. O que será que ele vale nesse imenso Mercado de gente em busca (HAHAHAHAAHAHAHHA, faça-me rir) da “CURA” da solidão.

As pessoas reclamam de serem tratadas como apenas mais um pedaço de carne, mas quando encontram alguém que vai na contramão dessa tendência, o que elas fazem? Como elas tratam esse alguém, senão perpetuando o mesmo sistema podre em voga. Triste.

Beijos aos lerem. E quem quiser comenta aí. ^-^
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sexta-feira, 2 de setembro de 2016

Desvanecendo (O Olhar Que Perdi)



Mexendo nos meus cadernos achei esse poema, que escrevi no auge do meu período de drogadição. Dei uma boa polida nele e aí vai:



Desvanecendo (O Olhar Que Perdi)


Meu mundo descontruo lentamente
Pela ambição de vê-lo
Com olhar de criança
Que jamais será meu novamente


Sem dificuldade me desfaço
Das poucas coisas que me esforçando,
Contra tudo consegui,
Conquistar passo a passo


É mais fácil deixá-lo morrer
O mundo doente
Caminho para a luz
Da alma se desvanecer

Sem descanso, sempre a lutar
Olhos secos, olhar sóbrio
Tudo aquilo que não suporto
Que mais quero abandonar
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Postagem 50, 10.000 visualizações e Comentários (É tudo sobre Amor)



Gente, essa é minha postagem Nº 50. 

EEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEE!!!!!

E semana passada eu cheguei ao incrível (ao menos para mim) número de 10.000 visitas no BLOG.

Estou encantado, mas, às vezes tenho dúvida se realmente tenho leitores ou se esse apenas é um desses site onde as pessoas caem, vêm do que se trata e dão o fora rapidinho. Digo isso por que uma dúvida me corrói: Por quê ninguém comenta, ué? O último comentário faz séculos. 

Então convido a quem quer que desejar fazer algum comentário, pergunta ou sugestão, que manisfeste-se e faça-o. Prometo não morder ninguém. Mesmo que ás vezes eu xingue alguém nas postagem, costumo ser educado com meus leitores. Ou pelo menos acho que era na época que comentavam ainda aqui no BLOG. Estou sentindo falta de ter essa interação com meus leitores (se vocês realmente existem). Não quer dizer que eu vá responder qualquer pergunta que fizerem. Tenhamos bom senso na hora fazê-las. Mas vou procurar fazer juz a atenção de vocês e responder tudo que me sentir confortável ou apto a fazê-lo.

Abaixo, para comemorar a postagem 50, coloco uma reflexão sobre a coisa que mais importa no mundo: AMOR. 
Escrevi essa reflexão após assistir ao filme Gia - Fama e Destruição. Espero que gostem. Beijos aos que lerem.


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É TUDO SOBRE AMOR


É tudo sobre Amor

É tudo sobre Início e Fim.

Tudo começa com Amor e termina com Amor

E entre o Início e o Fim, existe apenas o Perdão.

Que nada mais é do que Amor

Pois Amar é perdoar.

Amor é Perdão.

Só há um Fim se houver Amor

Só há um Começo se houver Amor

Portanto, é tudo a mesma coisa.

O Início e o Fim.

O Amor e o Perdão

O Começo e o Amor

O Final e o Perdão

O Começo e o Perdão.

O Final e o Amor

É tudo que precisamos saber.

Pois isso é Deus.

Deus é Amor

Amor é Perdão.

E isso é tudo que realmente temos.
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terça-feira, 16 de agosto de 2016

Plano B (Segurança)




Mesmo que as vezes eu pense, diga, escreva que te odeio, ou aja como se isso fosse real, a verdade é que a maior parte de mim, te ama. O que estraga tudo é precisar e depender completamente de ti.

Aquele dia que eu falei que caso tu e a mãe morressem, “eu estaria fudido”, não quis ser e parecer mesquinho. Não estava pensando em herança ou coisa do gênero, muito menos desejando a morte de ninguém. Estava, na realidade, atestando o quão frágil é minha situação nesse mundo. O que me deixa me amedronta terrivelmente.

Em relação a meus sentimentos por ti, o que me deixa furioso é saber que, provavelmente, jamais vou corresponder ás tuas expectativas em relação a mim. E isso é horrível, pois já tenho experiência em não corresponder as expectativas das pessoas. Desde que me entendo por gente, pareço, dentre meus irmãos, primos, colegas de creche ou escolinha ou colégio, ser o que mais se afasta de encaixar-se nos moldes que tu, a mãe, e parece que a maioria dos adultos e o mundo desejavam que nos encaixássemos.

NOVIDADE: Isso não dói só em ti. Dói, talvez mais ainda, em mim.

Então me vejo hoje em dia nessa situação, onde eu sei que as probabilidades de corresponder ao que silenciosamente esperam de mim são quase nulas e as de que tu aceite isso e o fato de que tenho uma doença, atestada por diversos profissionais, que me impede de fazer muita coisa, também.

A raiva, a fúria que sinto, é por todos os motivos acima. É por saber que alguém que eu tanto busquei aprovação, ainda que soubesse não estar fazendo aquilo que esse alguém aprovasse, mesmo depois de todo esse tempo e (supostas) mudanças de ponto de vista, continua a me aprovar apenas parcialmente. Pois não aceita que tenho uma doença e, mesmo ele tendo possibilidade para tal, não me ajuda a pelo menos tentar criar uma rede de proteção para o caso de ele ou a mãe virem a faltar.

Ou seja, não existe um “Plano B”. Para falar a verdade, sequer existe um “Plano A”. Ao mesmo tempo que minha vida é estável, é uma bagunça no quesito segurança.

E que seja o que Deus quiser. Beijos ao que lerem.


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sexta-feira, 12 de agosto de 2016

Duplo (Dor que Corrói)



Pode ser que, as vezes, aquilo que preciso e/ou escolho e/ou peço para adquirir, não pareça essencial. Mas na maioria das vezes é. Em algumas delas ao meu trabalho, mesmo que esse trabalho não pareça verdadeiro e/ou importante e/ou sério e/ou relevante.

Mas ele é tudo isso. Mesmo que eu não tenha, por enquanto, nenhum retorno financeiro, ele é verdadeiro e importante e sério e relevante, para meu bem-estar, meu tratamento, meu coração e minha alma.

Ainda que me bem-estar, meu tratamento, meu coração, e minha alma, às vezes, não pareçam essenciais e/ou verdadeiros e/ou importantes e/ou sérios e/ou relevantes.

Mesmo que achem que sou um vagabundo, um marginal que apenas finge ter uma doença. Mesmo que eu pareça aquela Anjo Rebelde criança que finge estar doente para não ir à escola, entre ele e eu há um mundo de distância. A única coisa em comum, que permanece, é o medo, o horror, o desânimo e a desilusão com a vida. Ou talvez seja com o mundo. Quem sabe com ambos. Só que agora, depois de adulto, com as feridas do tempo, algumas cicatrizadas, outras não, podemos adicionar a revolta e o ódio. Falo desses sentimentos por que também foram semeados na infância. E muitos bem regados, pela intolerância, crueldade, preconceito, maldade e descuido de crianças e adultos que cruzaram meu caminho. As pessoas falam em lutar, como se eu fosse alguém que não fez isso, desde o jardim de infância. Pois lembro-me que desde de então já enfrentava o bullying, a rejeição, a incompreensão e a exclusão, e não só na escola.

É uma sorte eu estar vivo. Muitas crianças, adolescentes, de tanto ser espezinhados, primeiro tentando pedir ajuda, até um adulto lhe explicar o quanto seu comportamento de pedir ajuda é vergonhoso, e então, sem recorrer a mais ninguém, acabam continuando a ser pisados e humilhados até a morte. Até chegar o momento em que acreditam que realmente não valem nada, que são um lixo, que aqueles que os perseguem, são melhores e mais fortes e mais capazes do que eles. Crianças, adolescentes e adultos que escolhem a morte como suposto alívio. Como um jeito de dar um basta em tamanha degradação. Ou, ainda, livrar o mundo da imundície e inutilidade de suas presenças.

Me considero um sobrevivente.

Só que hoje em dia, o sentimento que predomina, é o medo do futuro. Não tenho nenhuma segurança. Quando digo que sou parcialmente incapaz, quero dizer que não sou suficientemente constante e resistente ao estresse, para ter um emprego fixo. Ou uma, profissão da qual DEPENDER. E que passarei fome novamente, enfeitando a situação, como se fosse uma dieta para fins estéticos.

Em vez disso posso tentar, como já quase fiz certa vez , a profissão mais antiga do mundo. Daquela vez não se concretizou. Pode ser que dessa tenha sucesso, por, em desespero, concluir que valho muito menos do que pensei naquela vez.

Provavelmente iria recair nas drogas, moraria nas ruas, sei lá, até morrer como indigente. Mais um cadáver anônimo para encher o necrotério.

Ninguém entende, ninguém traças paralelas para (ninguém quer) entender.

A dor constante que me acompanha, como um duplo, desde que me lembro de mim como ser humano, desde que tenho consciência de mim mesmo.

A dor que agora cria inimigos por todos os lados, até dentro da minha própria família, até na minha casa, solitária e vazia. Essa dor me limita.

Mas ter limitações não é algo tão diferentes das outras pessoas. Todos tem limitações. Algumas superáveis, outras não. Até por que cada indivíduo é um indivíduo. Nem sempre o que um consegue, o outro consegue também. Mesmo que sejam aparentemente iguais. Para cada pessoa existem obstáculos, uns que são transponíveis, para todas, alguns que são transponíveis para apenas alguns. E alguns que não são transponíveis para “aqueles alguns”, mas para os restantes, sim.

Infelizmente minha dor, meu duplo, não me permite ter um emprego/profissão/ofício que me sustente e dê segurança e estabilidade a longo prazo.

Essa dor, esse duplo, sussurra coisas em meus ouvidos. Ideias em meu cérebro, desconfianças em meu senso crítico, até conseguir que todos estejam contra mim e eu não suporte mais. Ela me distrai, confunde, amedronta, corrói, destrói.

Porra, é tão difícil de entender, que fica quase impossível fazer certas coisas, enquanto você é distraído, confundido, amedrontado, destruído e corroído por dentro? E, para aquelas pessoas que pensam ou falam “Mas tu consegue ouvir música, ver TV.”:

Deixem de ser burros. Não façam leitura seletiva. Leiam o texto todo e entenderão. E só para saberem, dependendo da época, da fase, nem ver um filme eu conseguia.

Desculpem o drama. Beijos aos que lerem.
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segunda-feira, 8 de agosto de 2016

Eu Sei Que Não...



A verdade é que não preciso morar ao lado de irmão, pai ou qualquer outro parente. Isso não vai me salvar. Pelo contrário. Estar próximo de vocês é como ter um câncer dentro de mim, crescendo, com sua escuridão a corroer, conspurcar e deteriorar tudo que sou, quero e posso fazer. Sinto-me impotente, furioso por saber-me observado, controlado, boicotado, nas pequenas coisas e detalhes que poluem e envenenam meu cotidiano através do controle que vocês tentam exercer sobre mim.

Se eu me cortasse, não estaria fazendo aquilo que vocês querem (ou estaria, vai-se lá saber), mas me prejudicaria, pois as marcas poderiam trazer consequências indesejadas para mim. Sobra-me apenas o suicídio, pois eu não iria sofre consequências, pelo menos não da forma que vocês, seus filhos da puta, pudessem ver. Eu apena cessaria de existir, ou existiria em outro lugar onde talvez o câncer fosse pior, mas não seria tão podre e sórdido quanto o câncer que é fazer parte dessa família.

Mas o Rivotril não deixa.

Agora já estou Rivotrilizado, e só o que resta é o aspecto intelectual da coisa toda. O ódio cristalizado em IDÉIA. A observação, controle e boicote, como TEORIA.

Alguém mais cético diria: DE CONSPIRAÇÃO.

MAS EU SEI QUE NÃO…
Eu sei que não...
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quarta-feira, 13 de julho de 2016

It’s All About Love



“É sobre amor” - disse Alice, no final do filme “PARA SEMPRE ALICE”.

E eu decidi lutar. Mesmo que para outras pessoas e às vezes até para mim mesmo pareça uma derrota. Vou fazer mais “ECTs”, se a minha psiquiatra achar indicado. Tem muitas coisas que tenho meio que “esquecido” de mencionar para ela referente às “minhas paranóias” e ao sofrimento que estão me causando. A omissão foi por medo da prescrição de mais ECTs (a dra já havia me sugerido que faria bem) ou até de internação. Medo dos esquecimentos, perda de memória recente e acima de tudo da aura de derrota que o ECT carrega. Do estigma.

Hoje fui na minha psicóloga, pensando em falar para ela o quanto estava bem, por uma série de sinais e fatores que mencionaria para ela. Acabou que eu falei sobre o sofrimento que a paranóia me causa e na possibilidade de fazer ECTs novamente. Tentei contrapor com o fato de que mal me lembrava da época que fiz o ECT, o medo de me tornar um robozinho sem alma, de perder minha essência, de sacrificar aquilo que me torna EU.

Mas então, agora assisti “PARA SEMPRE ALICE”. Na verdade o nome do filme é “STILL ALICE”, algo como “AINDA ALICE”, pois a acompanha a história de uma mulher, relativamente jovem, e brilhantemente interpretada pela talentosíssima atriz (AMO-AMO-AMO) Julianne Moore, que descobre sofrer de um tipo raro e precoce de Alzheimer. O filme mostra todo o desenvolvimento da doença, mas que , no fim das contas, ninguém pode tirar dela ou apagar tudo que ela foi, fez e viveu. Mesmo que ela não lembre. Ainda que no período mais sombrio da doença não pareça, ela ainda é a Alice, a mesma que foi renomada professora de linguística com competência e brilhantismo.

Em certo momento do filme, um dos mais lindos e importantes, na minha opinião, Alice diz que às vezes as pessoas não nos levam a sério, por nosso comportamento estranho ou fala confusa. Na percepção dos outros, e algumas vezes na nossa também, nos tornamos ridículos, incapazes, cômicos. Mas ISSO, NÃO é quem nós SOMOS. Isso é a doença. Alice completa dizendo que apesar de tudo isso, não pensem que ela está SOFRENDO. Ela está, é LUTANDO. Ela fala também sobre perda. Perder coisas. Diz que estamos sempre perdendo algo. Assim como ela perde as memórias. Nada de tão diferente. Ainda que no final do filme, seja dito que nada se perde. Não realmente.

Assistindo ao filme me identifiquei com algumas coisas:

  • Com a impotência diante do avanço inexorável, que pode ser retardado, mas não detido, da doença. Afinal, ambas são doenças crônicas, podem ser tratadas, mas não curadas. A dela, o Alzheimer, a minha, o transtorno esquizoafetivo;


  • Com a percepção de que nos acham ridículos ou incapazes ou cômicos; 
  • Até com as perdas de memória. Eu as tenho, quando não por conta do ECT, por causa da quantidade de remédios que tomo, incluindo vez ou outra, o maior causador de esquecimentos, Rivotril; 
  • Me identifiquei MUITO também com a família amorosa, procurando dar suporte a ela. Apesar de, nas horas de paranóias eu me voltar contra eles ou vê-los como vilões, conspiradores ou sei lá o quê, tem um outro lado meu, talvez o são, que vê todo o apoio, suporte força e compreensão que eles me oferecem. Meu pai inclusive. Claro que nesse exato instante que escrevo isso, minha doença diz que é isso que ELES querem que eu pense. E fica o conflito; 
  • Conflito. Isso também é algo que me identifiquei. Ela luta contra a doença, se render-se. Assim como eu, seja tomando os medicamentos, seja indo nas consultas ou tendo feito ECT ano passado. 

E agora, vou partir para a luta de novo. Pode ser que na cabeça de gente ignorante, EU inclusive, isso pareça uma desistência de lutar contra a doença e rendição ao caminho mais fácil.

Mas o ECT não é fácil. É assustador. Causa amnésia. É extremamente estigmatizado. Mas funciona. Profissionais competentes e minha própria experiência mostram isso. E nenhuma doença filha da puta vai ditar minha opinião para que eu continue sofrendo. Pois agora, como disse Alice, não estou sofrendo. Estou lutando.

E como é dito no final do filme, “é sobre amor”. Tenho pessoas que me amam. Pais, irmãos e irmã, sobrinhos, afilhados, amigos. Meus filhotes caninos e felinos. Tenho todos os motivos para lutar.

Posso nunca derrotar a doença, mas terei vencido. Pois seguir lutando, é uma VITÓRIA.
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sexta-feira, 27 de maio de 2016

Mutilações (Derrotas Vitoriosas)



Anteontem me cortei de novo. Junto com a sensação de derrota, sinto-me vitorioso. Não quebrei nenhum objeto que me é caro, não cortei meus quadros com estilete como sinto vontade nessas horas, não briguei, não matei, agredi, seja física ou verbalmente, ninguém. 

Assim como se, caso eu me suicidasse, creio que no momento que estivesse no limiar, sentiria, além da óbvia derrota minha para o mundo, que venci, pois de qualquer forma, quaisquer que fossem as novas dificuldades que encontraria no outro lado (se houver outro lado), não seriam dificuldades arquitetadas por ELES. Eu estaria fora do alcance DELES e de suas conspirações. DELES e de seu controle. DELES e de sua falsidade e frieza calculista. Eu estaria além da incompreensão DELES. Da ignorância seletiva da qual ELE às vezes parece se orgulhar.

E isso tudo é para TI e para todos que te ajudam no teu plano absurdo, pelo fato de dependerem de TI (assim como eu), mesmo que não concordem com tua visão distorcida da minha doença e da realidade da qual ela faz parte. Por esse motivo visto o mesmo figurino que tu nessa encenação da qual fazemos parte em nossa família. Visto a falsidade e a frieza, mesmo que não consiga ser tão calculista quanto seria o necessário para não me machucar.

Então me corto e deixo claro: É para ti que faço isso. Para TE sinalizar. Para TU saber que caso um dia eu morra por minhas próprias mãos, houve 3 culpados. Minha doença, eu mesmo e por último, mas não menos importante TU. É muito difícil para mim, dizer que TE amo. Mas eu amo. Porém, por tudo que TU já fez até hoje na minha vida, nesse “tudo” que em muitos momentos foram tipos de mutilações, TE odeio com a mesma intensidade. TU disse que eu devia procurar temas mais iluminados para meus trabalhos de pintura, mas a verdade é que para cada mutilação que houve desde que me entendo por gente, houve também sangramentos, hemorragias internas em mim. Sangue que nunca saiu. Sangue que secou e transformou-se em sombras que habitam o âmago de meu ser. Quando sangro, meu sangue é negro. Como a tinta que eu costumo usar em minhas obras.

Me cortei, mas superficialmente. Nada preocupante. Meus únicos medos (desejos?) é de morrer de tétano, ou de cortar fundo demais, ou no lugar “errado”. Mas há certos medos que consigo superar, esse é um deles. Viu, apesar de tudo, TU também me inspira vencer meus medos, viu, amado, PAI?
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